sexta-feira, 31 de maio de 2013

Se um homem atravessasse o Paraíso, S. T. Coleridge

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Se um homem atravessasse o Paraíso em um sonho e lhe dessem uma flor como prova que havia estado ali, e se ao despertar encontrasse essa flor em sua mão... então o quê?

S. T. Coleridge


Samuel Taylor Coleridge (Ottery St. Mary, 21 de Outubro de 1772 — 25 de Julho de 1834), comumente designado por S. T. Coleridge, foi um poeta, crítico e ensaísta inglês, considerado, ao lado de seu colega William Wordsworth, um dos fundadores do romantismo na Inglaterra.

quinta-feira, 30 de maio de 2013

Canção da tarde no campo, Cecília Meireles


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Caminho do campo verde,
estrada depois de estrada.
Cercas de flores, palmeiras,
serra azul, água calada.

            Eu ando sozinha
            no meio do vale.
            Mas a tarde é minha.

Meus pés vão pisando a terra
Que é a imagem da minha vida:
tão vazia, mas tão bela,
tão certa, mas tão perdida!

            Eu ando sozinha
            por cima de pedras.
            Mas a flor é minha.

Os meus passos no caminho
são como os passos da lua:
vou chegando, vais fugindo,
minha alma é a sombra da tua.

            Eu ando sozinha
            por dentro dos bosques.
            Mas a fonte é minha.

De tanto olhar para longe,
não vejo o que passa perto.
subo monte, desço monte,
meu peito é puro deserto.

            Eu ando sozinha,
            ao longo da noite.
            Mas a estrela é minha.

Cecília Meireles

In: Meireles, Cecília.   Obra poética. Cecília Meireles. Rio de Janeiro: José Aguilar, 1958, p. 229-30.

quarta-feira, 29 de maio de 2013

É necessário abrir os olhos, Gabriel García Márquez

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"É necessário abrir os olhos e perceber que as coisas boas estão dentro de nós, onde os sentimentos não precisam de motivos nem os desejos de razão. O importante é aproveitar o
momento e aprender sua duração, pois a vida
está nos olhos de quem saber ver.“


Gabriel García Márquez

terça-feira, 28 de maio de 2013

Oração à dança, Santo Agostinho

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Louvada seja a dança
porque liberta o homem
do peso das coisas materiais,
e une os solitários
para formar sociedade.
Louvada seja a dança,
que tudo exige e
fortalece a saúde, uma mente serena
e uma alma encantada.
A dança significa transformar
o espaço, o tempo e o homem,
que sempre corre perigo
de se desfazer e de ser somente cérebro,
ou só vontade, ou só sentimento.
A dança, porém, exige
o ser humano inteiro,
ancorado no seu centro,
e que não conhece a vontade
de dominar gente e coisas,
e que não sente a obsessão
de estar perdido no seu ego.
A dança exige o homem livre e aberto
vibrando na harmonia de todas as forças.
Ó homem, ó mulher, aprende a dançar
senão os anjos do céu
não saberão o que fazer contigo.



Santo Agostinho


Colaboração de Adriana Cruz Raith.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

Às vezes, uma ou duas palavras amáveis, Thich Nhat Hanh


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"Às vezes, 
uma ou duas palavras amáveis 
são suficientes 
para ajudar alguém 
a desabrochar como uma flor."

Thich Nhat Hanh

domingo, 26 de maio de 2013

Vivemos entre dois infinitos, Marquês de Maricá

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“Vivemos entre dois infinitos, no tempo e no espaço: ocupamos um ponto da imensidade e duramos um instante da eternidade.”


Marquês de Maricá

Mariano José Pereira da Fonseca, 1º e único visconde com grandeza e marquês de Maricá (Rio de Janeiro, 18 de maio de 1773 — Rio de Janeiro, 16 de setembro de 1848), foi um escritor, filósofo e político brasileiro.
Foi ministro da Fazenda, conselheiro de estado e senador do Império do Brasil, de 1826 a 1848.

sábado, 25 de maio de 2013

Sorria, Charlie Chaplin



 
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Sorria, embora seu coração esteja doendo

Sorria, mesmo que ele esteja partido

Quando há nuvens no céu,

Você conseguirá...


Se você sorrir

Com seu medo e tristeza

Sorria e talvez amanhã

Você verá o sol brilhando, para você


Ilumine seu rosto com alegria

Esconda qualquer traço de tristeza

Embora uma lágrima possa estar tão próxima

Esse é o tempo que você tem que continuar tentando

Sorria, o que adianta chorar?

Você descobrirá que a vida ainda continua

Se você apenas sorrir


Este é o momento que você tem que continuar tentando

Sorria, de que adianta chorar?

Você descobrirá que a vida ainda continua

Se você apenas sorrir

Smile


Smile, though your heart is aching

Smile, even though it's breaking

When there are clouds in the sky

You'll get by...


If you smile

With your fear and sorrow

Smile and maybe tomorrow

You'll see the sun come shining through, for you


Light up your face with gladness

Hide every trace of sadness

Although a tear may be ever so near

That's the time you must keep on trying

Smile, what's the use of crying?

You'll find that life is still worthwhile

If you'll just smile


That's the time you must keep on trying

Smile, what's the use of crying?

You'll find that life is still worthwhile

If you'll just smile.

Charlie Chaplin
Smile é uma canção composta por Charlie Chaplin originalmente em 1936, para seu filme, Tempos Modernos. Em 1954, John Turner e Geoffrey Parsons adicionaram letra à canção. Na letra, o cantor está dizendo para o ouvinte se animar e que há sempre um futuro brilhante, se ele apenas sorrir.

Ouça também:
http://youtu.be/PQlIv-QHDto

sexta-feira, 24 de maio de 2013

O que faz você feliz? Clarice Falcão

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O que faz você feliz?
Você feliz o que que faz?
Você faz o que te faz feliz?
O que faz você feliz você que faz.
Pra ser feliz
Pra ser feliz
O que você faz pra ser feliz?
E se a felicidade voa num balão
Tão alto onde já não se enxerga mais
Mas só ela pode lhe tirar do chão
Pra ser feliz o que que você faz?
A felicidade está por dentro
Mas não vai sair no raio x
Você provoca os próprios sentimentos
O que você faz pra ser feliz?
Pra ser feliz
Pra ser feliz
O que você faz pra ser feliz?
Longe perto, dentro, tanto faz
Quem quer felicidade corre atrás
E, às vezes, ela está debaixo do nariz
O que você faz pra ser feliz?
Pra ser feliz
Pra ser feliz
O que você faz pra ser feliz?

Clarice Falcão

  
Assista ao vídeo

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Todos os dias, logo cedo, Caio Fernando Abreu

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"Todos os dias,
logo cedo,
dou uma piscadinha para Deus
e peço:
tomara
que as nossas vontades coincidam.
E...
se não coincidirem...
que a Tua prevaleça."

Caio Fernando Abreu

quarta-feira, 22 de maio de 2013

A árvore e a crisálida, Fábula e Filme O que traz boas novas

Flickr.com Ruth Altheim


Não há nada a dizer sobre
uma morte injusta.
Nada mesmo.
Nós vamos mostrar daqui a pouco.
Sob o galho de uma oliveira
estava suspensa uma pequena
crisálida de cor esmeralda.
Amanhã ela se tornaria uma bela
borboleta, liberada do seu casulo.
Tornaria,
r-i-a.
A árvore exultava em
liberar sua crisálida.
Mas em segredo, ela adoraria
guardá-la ainda uns anos.
Adoraria,
r-i-a.
“Para que ela
se lembrasse de mim.”
Ela a tinha protegido do vento.
Ela a tinha salvo das formigas.
E amanhã ela a deixaria
enfrentar sozinha…
os predadores e as intempéries.
r-e-s.
Naquela noite…
um grande incêndio
devastou a floresta,
e a crisálida
nunca se tornou borboleta.
De manhã,
o fogo apagado,
a árvore ainda estava de pé,
mas seu coração
estava em cinzas,
roído pelo fogo,
roído pelo luto.
Roído pelo luto.
Depois disso,
quando um pássaro
pousava na oliveira,
a árvore contava sobre a crisálida
que nunca acordou.
Ela a imagina
com as asas abertas,
ondulando no azul
de um céu azul,
bêbada de néctar e liberdade.


Fábula de Bachir Lazhar (personagem no filme "O que traz boas novas" (Monsieur Lazhar).

http://www.adorocinema.com/filmes/filme-183502/

terça-feira, 21 de maio de 2013

Há coisas que a gente não nota, Robert Pirsig

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"Há coisas que a gente não nota
porque são muito pequenas
para serem vistas.

Mas há outras que a gente não vê
porque são imensas..."

Robert Pirsig


Robert M. Pirsig ( Minneapolis, Minnesota, EUA, 6 de setembro, 1928) é um escritor e filósofo americano. Por ser uma criança superdotada, com um QI estimado em 170, aos 9 anos, Pirsig foi adiantado em vários graus na escola.

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Nego-me a aceitar o fim do homem, William Faulkner

Taming the dragon, Watercolor Painting by Jayni Bloch © 2004 
                                                        

'Nego-me a aceitar o fim do homem. Eu acredito que homem não apenas resistirá, como prevalecerá.....Ele é imortal, não porque apenas dentre as criaturas seja dotado de uma voz inexaurível, mas por possuir uma alma, um espírito capaz de compaixão, de sacrifício, de suportar o sofrimento.......A voz do poeta não deve servir apenas de testemunho do homem: ela deverá ser também uma das estacas, um dos pilares que o ajudará a resistir e a vencer".

William Faulkner

 

domingo, 19 de maio de 2013

A bagagem, fábula

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Conta-se uma fábula sobre um homem que caminhava vacilante pela estrada, levando uma pedra numa mão e um tijolo na outra. Nas costas carregava um saco de terra; em volta do peito trazia vinhas penduradas. Sobre a cabeça equilibrava uma abóbora pesada.
Pelo caminho encontrou um transeunte que lhe perguntou:
- Cansado viajante, por que carrega essa pedra tão grande?
- É estranho, respondeu o viajante, mas eu nunca tinha realmente notado que a carregava.
Então, ele jogou a pedra fora e se sentiu muito melhor.
Em seguida veio outro transeunte que lhe perguntou:
- Diga-me, cansado viajante, por que carrega essa abóbora tão pesada?
- Estou contente que me tenha feito essa pergunta, disse o viajante, porque eu não tinha percebido o que estava fazendo comigo mesmo.
Então ele jogou a abóbora fora e continuou seu caminho com passos muito mais leves. Um por um, os transeuntes foram avisando-o a respeito de suas cargas desnecessárias. E ele foi abandonando uma a uma.
Por fim, tornou-se um homem livre e caminhou como tal.
Qual era na verdade o problema dele?
A pedra e a abóbora?
Não!
Era a falta de consciência da existência delas. Uma vez que as viu como cargas desnecessárias, livrou-se delas bem depressa e já não se sentia mais tão cansado. Esse é o problema de muitas pessoas. Elas estão carregando cargas sem perceber. Não é de se estranhar que estejam tão cansadas!
O que são algumas dessas cargas que pesam na mente de um homem e que roubam as suas energias?
- Pensamentos negativos.
- Culpar e acusar outras pessoas.
- Permitir que impressões tenebrosas descansem na mente.
- Carregar uma falsa carga de culpa por coisas que não poderiam ter evitado.
- Auto-piedade.
- Acreditar que não existe saída.
Todo mundo tem o seu tipo de carga especial, que rouba energia. Quanto mais cedo começarmos a descarregá-la, mais cedo nos sentiremos melhor e caminharemos mais levemente

sábado, 18 de maio de 2013

A solidão amiga, Rubem Alves

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A noite chegou, o trabalho acabou, é hora de voltar para casa. Lar, doce lar? Mas a casa está escura, a televisão apagada e tudo é silêncio. Ninguém para abrir a porta, ninguém à espera. Você está só. Vem a tristeza da solidão... O que mais você deseja é não estar em solidão...
Mas deixa que eu lhe diga: sua tristeza não vem da solidão. Vem das fantasias que surgem na solidão. Lembro-me de um jovem que amava a solidão: ficar sozinho, ler, ouvir, música... Assim, aos sábados, ele se preparava para uma noite de solidão feliz. Mas bastava que ele se assentasse para que as fantasias surgissem. Cenas. De um lado, amigos em festas felizes, em meio ao falatório, os risos, a cervejinha. Aí a cena se alterava: ele, sozinho naquela sala. Com certeza ninguém estava se lembrando dele. Naquela festa feliz, quem se lembraria dele? E aí a tristeza entrava e ele não mais podia curtir a sua amiga solidão. O remédio era sair, encontrar-se com a turma para encontrar a alegria da festa. Vestia-se, saía, ia para a festa... Mas na festa ele percebia que festas reais não são iguais às festas imaginadas. Era um desencontro, uma impossibilidade de compartilhar as coisas da sua solidão... A noite estava perdida.
Faço-lhe uma sugestão: leia o livro A chama de uma vela, de Bachelard. É um dos livros mais solitários e mais bonitos que jamais li. A chama de uma vela, por oposição às luzes das lâmpadas elétricas, é sempre solitária. A chama de uma vela cria, ao seu redor, um círculo de claridade mansa que se perde nas sombras. Bachelard medita diante da chama solitária de uma vela. Ao seu redor, as sombras e o silêncio. Nenhum falatório bobo ou riso fácil para perturbar a verdade da sua alma. Lendo o livro solitário de Bachelard eu encontrei comunhão. Sempre encontro comunhão quando o leio. As grandes comunhões não acontecem em meio aos risos da festa. Elas acontecem, paradoxalmente, na ausência do outro. Quem ama sabe disso. É precisamente na ausência que a proximidade é maior. Bachelard, ausente: eu o abracei agradecido por ele assim me entender tão bem. Como ele observa, "parece que há em nós cantos sombrios que toleram apenas uma luz bruxoleante. Um coração sensível gosta de valores frágeis". A vela solitária de Bachelard iluminou meus cantos sombrios, fez-me ver os objetos que se escondem quando há mais gente na cena. E ele faz uma pergunta que julgo fundamental e que proponho a você, como motivo de meditação: "Como se comporta a Sua Solidão?" Minha solidão? Há uma solidão que é minha, diferente das solidões dos outros? A solidão se comporta? Se a minha solidão se comporta, ela não é apenas uma realidade bruta e morta. Ela tem vida.
Entre as muitas coisas profundas que Sartre disse, essa é a que mais amo: "Não importa o que fizeram com você. O que importa é o que você faz com aquilo que fizeram com você." Pare. Leia de novo. E pense. Você lamenta essa maldade que a vida está fazendo com você, a solidão. Se Sartre está certo, essa maldade pode ser o lugar onde você vai plantar o seu jardim.
Como é que a sua solidão se comporta? Ou, talvez, dando um giro na pergunta: Como você se comporta com a sua solidão? O que é que você está fazendo com a sua solidão? Quando você a lamenta, você está dizendo que gostaria de se livrar dela, que ela é um sofrimento, uma doença, uma inimiga... Aprenda isso: as coisas são os nomes que lhe damos. Se chamo minha solidão de inimiga, ela será minha inimiga. Mas será possível chamá-la de amiga? Drummond acha que sim: "Por muito tempo achei que a ausência é falta./ E lastimava, ignorante, a falta./ Hoje não a lastimo./ Não há falta na ausência. A ausência é um estar em mim./ E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,/ que rio e danço e invento exclamações alegres,/ porque a ausência, essa ausência assimilada,/ ninguém a rouba mais de mim.!"
Nietzsche também tinha a solidão como sua companheira. Sozinho, doente, tinha enxaquecas terríveis que duravam três dias e o deixavam cego. Ele tirava suas alegrias de longas caminhadas pelas montanhas, da música e de uns poucos livros que ele amava. Eis aí três companheiras maravilhosas! Vejo, frequentemente, pessoas que caminham por razões da saúde. Incapazes de caminhar sozinhas, vão aos pares, aos bandos. E vão falando, falando, sem ver o mundo maravilhoso que as cerca. Falam porque não suportariam caminhar sozinhas. E, por isso mesmo, perdem a maior alegria das caminhadas, que é a alegria de estar em comunhão com a natureza. Elas não vêem as árvores, nem as flores, nem as nuvens e nem sentem o vento. Que troca infeliz! Trocam as vozes do silêncio pelo falatório vulgar. Se estivessem a sós com a natureza, em silêncio, sua solidão tornaria possível que elas ouvissem o que a natureza tem a dizer. O estar juntos não quer dizer comunhão. O estar juntos, frequentemente, é uma forma terrível de solidão, um artifício para evitar o contato conosco mesmos. Sartre chegou ao ponto de dizer que "o inferno é o outro." Sobre isso, quem sabe, conversaremos outro dia... Mas, voltando a Nietzsche, eis o que ele escreveu sobre a sua solidão:
"Ó solidão! Solidão, meu lar!... Tua voz - ela me fala com ternura e felicidade!
Não discutimos, não queixamos e muitas vezes caminhamos juntos através de portas abertas.
Pois onde quer que estás, ali as coisas são abertas e luminosas. E até mesmo as horas caminham com pés saltitantes.
Ali as palavras e os tempos/poemas de todo o ser se abrem diante de mim. Ali todo ser deseja transformar-se em palavra, e toda mudança pede para aprender de mim a falar."
E o Vinícius? Você se lembra do seu poema O operário em construção? Vivia o operário em meio a muita gente, trabalhando, falando. E enquanto ele trabalhava e falava ele nada via, nada compreendia. Mas aconteceu que, "certo dia, à mesa, ao cortar o pão, o operário foi tomado de uma súbita emoção ao constatar assombrado que tudo naquela casa - garrafa, prato, facão - era ele que os fazia, ele, um humilde operário, um operário em construção (...) Ah! Homens de pensamento, não sabereis nunca o quando aquele humilde operário soube naquele momento! Naquela casa vazia que ele mesmo levantara, um mundo novo nascia de que nem sequer suspeitava. O operário emocionado olhou sua própria mão, sua rude mão de operário, e olhando bem para ela teve um segundo a impressão de que não havia no mundo coisa que fosse mais bela. Foi dentro da compreensão desse instante solitário que, tal sua construção, cresceu também o operário. (...) E o operário adquiriu uma nova dimensão: a dimensão da poesia."
Rainer Maria Rilke, um dos poetas mais solitários e densos que conheço, disse o seguinte: "As obras de arte são de uma solidão infinita." É na solidão que elas são geradas. Foi na casa vazia, num momento solitário, que o operário viu o mundo pela primeira vez e se transformou em poeta.
E me lembro também de Cecília Meireles, tão lindamente descrita por Drummond:
"...Não me parecia criatura inquestionavelmente real; e por mais que aferisse os traços positivos de sua presença entre nós, marcada por gestos de cortesia e sociabilidade, restava-me a impressão de que ela não estava onde nós a víamos... Distância, exílio e viagem transpareciam no seu sorriso benevolente? Por onde erraria a verdadeira Cecília..."
Sim, lá estava ela delicadamente entre os outros, participando de um jogo de relações gregárias que a delicadeza a obrigava a jogar. Mas a verdadeira Cecília estava longe, muito longe, num lugar onde ela estava irremediavelmente sozinha.
O primeiro filósofo que li, o dinamarquês Soeren Kiekeggard, um solitário que me faz companhia até hoje, observou que o início da infelicidade humana se encontra na comparação. Experimentei isso em minha própria carne. Foi quando eu, menino caipira de uma cidadezinha do interior de Minas, me mudei para o Rio de Janeiro, que conheci a infelicidade. Comparei-me com eles: cariocas, espertos, bem falantes, ricos. Eu diferente, sotaque ridículo, gaguejando de vergonha, pobre: entre eles eu não passava de um patinho feio que os outros se compraziam em bicar. Nunca fui convidado a ir à casa de qualquer um deles. Nunca convidei nenhum deles a ir à minha casa. Eu não me atreveria. Conheci, então, a solidão. A solidão de ser diferente. E sofri muito. E nem sequer me atrevi a compartilhar com meus pais esse meu sofrimento. Seria inútil. Eles não compreenderiam. E mesmo que compreendessem, eles nada podiam fazer. Assim, tive de sofrer a minha solidão duas vezes sozinho. Mas foi nela que se formou aquele que sou hoje. As caminhadas pelo deserto me fizeram forte. Aprendi a cuidar de mim mesmo. E aprendi a buscar as coisas que, para mim, solitário, faziam sentido. Como, por exemplo, a música clássica, a beleza que torna alegre a minha solidão...
A sua infelicidade com a solidão: não se deriva ela, em parte, das comparações? Você compara a cena de você, só, na casa vazia, com a cena (fantasiada) dos outros, em celebrações cheias de risos... Essa comparação é destrutiva porque nasce da inveja. Sofra a dor real da solidão porque a solidão dói. Dói uma dor da qual pode nascer a beleza. Mas não sofra a dor da comparação. Ela não é verdadeira.
Mas essa conversa não acabou: vou falar depois sobre os companheiros que fazem minha solidão feliz.


Rubem Alves

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Cântico da terra, Cora Coralina

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Eu sou a terra, eu sou a vida.
Do meu barro primeiro veio o homem.
De mim veio a mulher e veio o amor.
Veio a árvore, veio a fonte.
Vem o fruto e vem a flor.

Eu sou a fonte original de toda vida.
Sou o chão que se prende à tua casa.
Sou a telha da coberta de teu lar.
A mina constante de teu poço.
Sou a espiga generosa de teu gado
e certeza tranquila ao teu esforço.

Sou a razão de tua vida.
De mim vieste pela mão do Criador,
e a mim tu voltarás no fim da lida.
Só em mim acharás descanso e Paz.

Eu sou a grande Mãe Universal.
Tua filha, tua noiva e desposada.
A mulher e o ventre que fecundas.
Sou a gleba, a gestação, eu sou o amor.

A ti, ó lavrador, tudo quanto é meu.
Teu arado, tua foice, teu machado.
O berço pequenino de teu filho.
O algodão de tua veste
e o pão de tua casa.

E um dia bem distante
a mim tu voltarás.
E no canteiro materno de meu seio
tranqüilo dormirás.

Plantemos a roça.
Lavremos a gleba.
Cuidemos do ninho,
do gado e da tulha.
Fartura teremos
e donos de sítio
felizes seremos.

Cora Coralina

quinta-feira, 16 de maio de 2013

quarta-feira, 15 de maio de 2013

Toda Palavra, Viviane Mosé

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"Eu procuro uma palavra que me salve.
Pode ser uma palavra verbo.
Uma palavra vespa, uma palavra casta.
Pode ser uma palavra dura, sem carinho.
Ou palavra muda, 
Molhada de suor no esforço da terra não lavrada.
Não ligo se ela vem suja, mal lavada.
Procuro uma coisa qualquer que saia soada do nada.
Eu imploro pelos verbos que tanto humilhei.
E reconsidero minha posição em relação aos adjetivos.
Penso em quanta fadiga me dava,
O excesso de frases desalinhadas em meu ouvido.
Hoje imploro uma fala escrita.
Não pode ser cantada.
Preciso de uma palavra como um porto um mar um prado.
Um campo minado um contorno.
Carrossel cavalo pente quebrado véu.
Mariscos muralhas manivelas navalhas.
Eu preciso do escarcéu soletrado.
Preciso daquilo que havia negado.
E mesmo tendo medo de algumas palavras
Preciso da palavra medo como preciso da palavra morte,
Que é uma palavra triste.
Toda palavra deve ser anunciada e ouvida.
Nunca mais o desprezo por coisas mal ditas.
Toda palavra é bem dita e bem vinda."

Viviane Mosé


In: Receita para lavar palavra suja - poemas escolhidos em prosa e verso, Edições Arteclara, 2004, p.19

terça-feira, 14 de maio de 2013

Quando acordei hoje de manhã, Lewis Carrol

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“A senhora me desculpe, mas no momento não tenho muita certeza. Quer dizer, eu sei quem eu era quando acordei hoje de manhã, mas já mudei uma porção de vezes desde que isso aconteceu. Receio que não possa me explicar, Dona Lagarta, porque é justamente aí que está o problema. Posso explicar uma porção de coisas mas não posso explicar a mim mesma…”  

Alice no País das Maravilhas - Lewis Carrol

segunda-feira, 13 de maio de 2013

A alma é invisível, Roseana Murray

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"A alma é invisível,
um anjo é invisível,
o vento é invisível,
o pensamento é invisível.
E no entanto, com delicadeza,
pode-se enxergar a alma,
pode-se perceber o anjo,
pode-se sentir o vento...
Pode-se mudar o mundo com alguns pensamentos!"

 
Roseana Murray


In: "O Manual da Delicadeza, de A a Z."

domingo, 12 de maio de 2013

A vida é uma peça de teatro, Charlie Chaplin



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"A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso, cante, chore, dance, ria e viva intensamente, antes que a cortina se feche e a peça termine sem aplausos."
 
Charlie Chaplin

sábado, 11 de maio de 2013

Olhos encantados, Rubem Alves

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[...]Por isso quero ensinar as crianças. Elas ainda têm olhos encantados. Seus olhos são dotados daquela qualidade que, para os gregos, era o início do pensamento: a capacidade de se assombrar diante do banal. Tudo é espantoso: um ovo, uma minhoca, um ninho de guacho, uma concha de caramujo, o vôo dos urubus, o zinir das cigarras, o coaxar dos sapos, os pulos dos gafanhotos, uma pipa no céu, um pião na terra. Dessas coisas, invisíveis aos eruditos olhos dos professores universitários (eles não podem ver, coitados. A especialização os tornou cegos como toupeiras. Só vêem dentro do espaço escuro de suas tocas. E como vêem bem!), nasce o espanto diante da vida; desse espanto, a curiosidade; da curiosidade, a fuçação (essa palavra não está no Aurélio!) chamada pesquisa; dessa fuçação, o conhecimento; e do conhecimento, a alegria!
 As coisas mais importantes não são ensinadas por meio de aulas bem preparadas. Elas são ensinadas inconscientemente. Bom seria que os educadores lessem ruminativamente (também não se encontra no Aurélio) o Roland Barthes. Ele descreveu o seu ideal de aula como sendo a criação de um espaço - isso mesmo! um espaço! - parecido com aquele que existe quando uma criança brinca ao redor da mãe. Explico. A criança pega um botão, leva para a mãe. A mãe ri, e faz um corrupio. (Você sabe o que é um corrupio?). Pega um pedaço de barbante. Leva para a mãe. A mãe ri e lhe ensina a fazer nós. Ele conclui que o importante não é nem o botão e nem o barbante, mas esse espaço lúdico que se ensina sem que se fale sobre ele.

Trecho: Escola da Ponte - 5.

Rubem Alves

 In:  A escola  com  que  sempre  sonhei  sem imaginar que pudesse existir (Papirus Editora,  Campinas,  SP,  2001  e  Edições  Asa,  Porto,  2001).


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